sexta-feira, 23 de novembro de 2012

O HISSOPE DE ELVAS

 
Em 1768, o bispo de Elvas, D. Lourenço de Lencastre, e o deão do cabido, José Carlos de Lara, tiveram um arrufo que pôs fim ao costume que o último tinha em obsequiar o hissope (ou aspersório, instrumento utilizado para aspergir água benta) ao bispo, sempre que este se dirigia à sé. Ofendido, D. Lourenço de Castro conseguiu que o cabido emitisse um acórdão para obrigar o deão a continuar a executar o antigo costume. O deão protestou ao cabido, ao bispo e até ao metropolita de Évora, vendo sempre baldados os seus esforços e acabando mesmo por morrer, poucos meses depois, sem ver alterada a sentença. Sucedeu-lhe no cargo um seu sobrinho, ao qual também se exigiu o mesmo, sob pena de repreensão e multa. Sem se deixar intimidar, o novo deão apelou desta vez à Coroa. Prevendo um desfecho malogrado, o bispo e o cabido acabaram por riscar os acórdãos do respectivo livro e negar tudo o que se tinha passado.
Este caso, que durou à volta de dois anos, foi acompanhado de perto pelos habitantes de Elvas, entre os quais se encontrava António Diniz da Cruz e Silva, exercendo funções de magistratura junto do exército da cidade. Tendo sido um dos fundadores da Nova Arcádia, Diniz aproveitou os seus dotes poéticos para caricaturizar esta "bagatela", compondo assim uma obra intitulada O Hissope, que começava com os seguintes versos:
 
Eu canto o Bispo e a espantosa guerra
Que o hissope excitou na Igreja d'Elvas.

Fonte: ArposeFolha de rosto da 1.ª edição


O Hissope tem a particularidade de ter sido o primeiro poema heróico-cómico criado em Portugal, género hoje desaparecido que se caracterizava por celebrar (e de igual forma satirizar) em tom épico um acontecimento sem qualquer importância, como era o presente caso. A crítica incisiva que Diniz fazia às vaidades eclesiásticas (retratando um clero ignorante, mundano e soberbo) não agradou à censura da Intendência Geral da Polícia – note-se que a Inquisição, apesar de continuar a existir, tinha perdido muita da sua força desde o tempo do Marquês de Pombal – , que proibiu a obra de ser publicada em Portugal. Contudo, não se conseguiu impedir que proliferassem e circulassem diversas cópias manuscritas. Francisco Augusto Martins de Carvalho, na obra abaixo mencionada, catalogou 54 exemplares manuscritos, com algumas variantes entre si, que se encontravam recolhidos em bibliotecas nacionais (embora possivelmente existam ou tenham existido muitos mais). As variantes aludidas entre estes exemplares derivam provavelmente do facto de António Diniz da Cruz e Silva ter ido aumentando, corrigindo e retocando O Hissope quase até 1799, ano em que morreu. Somente três anos depois é que finalmente era publicada a primeira versão impressa. Talvez para desviar a atenção da censura da Intendência da Polícia, que controlava de forma cerrada tudo o que vinha da França desde os tempos da Revolução, esta primeira edição saiu à estampa com a menção de ter sido publicada em Londres, como se pode ver à esquerda, apesar de na verdade ter sido impressa em Paris. Contudo, de pouco serviu esta dissimulação, pois logo em 1803, o Intendente Geral da Polícia, Pina Manique, mandava afixar em edital um aviso proibindo a venda ou divulgação em Portugal de O Hissope.


Foi assim preciso esperar até ao ano de 1808 para esta obra sair da ignomínia da censura portuguesa, quando o Governo de Junot deu permissão para se publicá-la em Portugal. É possível que uma das razões para essa autorização fosse a semelhança entre esta obra e Le Lutrin de Nicolas Boileau, obra de idêntico teor que já circulava na França há mais de cem anos, e que o próprio autor português tomara confessadamente como modelo de inspiração (embora alguns autores, entre os quais Almeida Garrett, garantam que Diniz ultrapassou a obra de Boileau). Também se deve notar que a iniciativa da publicação de um livro que desmascarava o absurdo e a hipocrisia de certas convenções religiosas era conforme àquela afirmação de Junot, na sua proclamação de 1 de Fevereiro, quando dizia aos portugueses que "a religião de vossos pais [...] será protegida e socorrida [...], mas livre das superstições que a desonram". Num país onde o clero tinha um poder enorme, esta obra caía como uma bomba, e os franceses deviam ter plena consciência disso. Por outro lado, O Hissope continha passagens que se encaixavam perfeitamente naqueles tempos, como a seguinte:

Ao pé de cada esquina, hoje, sem pejo,
Se tratam de Monsieur os portugueses.
Isto, senhor, é moda, e como é moda,
A quisemos seguir; e sobretudo,
Mostrar ao mundo que francês sabemos.

Na verdade, esta segunda edição é hoje raríssima, pois logo que os franceses saíram do país (em Setembro de 1808), mandaram-se recolher os seus exemplares, e novamente foi proibida a venda e divulgação desta obra. Só depois da implantação do regime liberal é que se permitiu que O Hissope fosse novamente publicado em Portugal, embora entretanto se tivessem publicado diversas edições em Paris.

Apesar desta censura de quase meio século, O Hissope, a "verdadeira coroa poética" de António Diniz da Cruz e Silva, no entender de Almeida Garrett, não perdeu a sua força e vivacidade, pois só contando até ao ano de 1921, foi editado pelo menos vinte e quatro vezes, três das quais traduzido para o francês. Uma média invejável, tendo em conta o perfil da obra. Note-se que, ainda até aquele ano, o poema também já tinha sido alvo de outras traduções (embora parciais) em inglês e alemão. De 1921 para cá foi publicado pelo menos mais cinco vezes em Portugal, a última das quais através de uma nova edição crítica de Ana María García Martín e Pedro Serra (O Hissope. Poema Herói-Cómico, Coimbra, Angelus Novus Editora, 2006)...
 

CASTELO DE ELVAS


Elvas constituiu, desde a Idade Média até ao século XVIII, um ponto estratégico da defesa da zona raiana do Alto Alentejo. O perigo espreitava próximo e tinha um nome: Espanha.
Esta cidade alentejana possui um magnífico sistema defensivo, aproveitando as ligeiras elevações que dominam a vasta planície em redor e a proximidade do rio Guadiana. Numa dessas suaves elevações foi erguido o seu castelo medieval.
Anteriormente, no mesmo local, os povos pré-romanos ergueram um castro, aproveitado pelos Romanos e remodelado por Visigodos e Árabes - no tempo destes últimos batizado com o nome de Ielbax.
A fortaleza árabe poderá ter sido conquistada próximo do ano de 1166, pelas tropas comandadas por Geraldo Geraldes, o Sem Pavor. No entanto, a reconquista definitiva para as armas cristãs ocorreria sessenta anos mais tarde, com D. Sancho II, monarca que procederia a importantes melhoramentos nas muralhas de Elvas, acrescentadas posteriormente por D. Dinis.
As inúteis e desastrosas guerras de D. Fernando I com Castela, na era de Trezentos, levaram o nosso monarca a dotar o castelo de Elvas com uma terceira cortina de muralhas.
Na crise dinástica de 1383-1385, o alcaide de Elvas tomou o partido de D. Beatriz e de Castela. Contudo, a população, enquadrada pelo corajoso Gil Fernandes, atacou a fortaleza e prendeu o seu alcaide. Gil Fernandes declarou fidelidade a Portugal e a D. João I, o que lhe valeu um longo cerco de 25 dias pelas tropas castelhanas. No entanto, a sedição revelou-se inútil e Elvas continuou livre, agora com Gil Fernandes empossado pelo mestre de Avis como seu novo alcaide.
Em 1580, o País perdeu a sua independência e o governador militar de Elvas a vergonha. Com efeito, a troco de dinheiro, Elvas entregou-se aos espanhóis. Contudo, 60 anos mais tarde voltaria a ser resgatada, não sem que antes se travassem violentos combates ao longo do século XVII. Nessa altura, Elvas foi eleita como centro do governo militar do Alentejo, cuja chefia coube ao general Matias de Albuquerque, militar que procedeu à realização das modernas obras de remodelação do perímetro defensivo desta cidade alentejana.
As melhorias foram assinaláveis, como ficou demonstrado em novembro de 1644. Nessa ocasião, um poderoso exército espanhol de quinze mil homens, comandados pelo marquês de Torrecusa, atacou a guarnição elvense, que contava nas suas fileiras apenas dois mil homens. Apesar da inferioridade numérica, os espanhóis não lograram os seus intentos e voltaram desmoralizados para Badajoz.
Os sucessivos governadores militares da fortaleza não estavam ainda contentes com as fortificações elvenses e procuraram melhorar o seu perímetro defensivo, de modo a torná-lo completamente inexpugnável. Notáveis construções modernas abaluartadas espalharam-se na área da cidade e nos montes circundantes. Assim, pela mão de importantes engenheiros militares dos séculos XVII e XVIII, surgiram uma série de baluartes e meio-baluartes, extensas cortinas e os fortes de S. Francisco, de S. Mamede, de S. Pedro, da Piedade e de Santa Luzia. Na parte interna do burgo implantaram-se quartéis, casamatas, paióis, a grande cisterna e outros depósitos. O polígono militar de Elvas ficaria completo no século XVIII com o formidável e poderoso Forte de N. Sra. da Graça.
Apesar de continuarem ativas até ao presente século, as defesas de Elvas tiveram o seu momento maior em janeiro de 1659, no episódio que ficou conhecido por Batalha das Linhas de Elvas. Este recontro com os espanhóis saldou-se por uma retumbante vitória das armas nacionais, que, deste modo, salvaram a cidade e o País de perderem a sua independência.
O castelo medieval de Elvas era formado por três cortinas defensivas, mantendo duas delas importantes obras do período muçulmano. A primeira linha de defesa foi absorvida pela cidade, subsistindo duas das suas portas: a da Alcáçova e a do Miradeiro. Também destruída em grande parte pela pressão urbana, a linha intermédia era rasgada por quatro portas - respetivamente pela da Ferrada, Porta Nova ou da Encarnação, de Santiago e do Bispo. A muralha fernandina foi dotada de 22 torreões defensivos, 11 portas - modificadas e reduzidas a três pelas obras do século XVII (respetivamente de Évora, Olivença e S. Vicente) - e barbacã de apoio.
No ponto mais elevado da colina do nordeste, denominada Costa da Vila Fria, ergue-se o castelo medieval do tempo de D. Sancho II, remodelado por D. Dinis e fortalecido por D. João II e D. Manuel I.
Ladeado por duas torres quadrangulares, a mais alta correspondendo à menagem, rasga-se o portal da entrada, que é protegido por balcão sustentado por mísulas, podendo ver-se aqui o brasão de armas de D. João II.
Após um trecho de muralhas ameadas surge uma invulgar e interessante torre hexagonal irregular, rasgada por aberturas de troneiras, coberta por cúpula semiesférica e envolta por adarve protegido por parapeito com largos merlões. No centro da praça de armas são ainda visíveis alguns fragmentos arquitetónicos, denunciando diferentes épocas construtivas e estilísticas.
 

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

DETALHES


RONCAS DE ELVAS - ELVAS


POTE DE ARTESANATO - ELVAS


RECORDANDO - BARBACENA


DIANE - ELVAS


ROTATIVA DE JORNAL - ELVAS


MURALHAS - ELVAS


ANTIGA CASA DO POVO - ELVAS


FONTE ANTIGA, POTERNA S. PEDRO - ELVAS


ANTIGA MANUTENÇÃO MILITAR - ELVAS


RECINTO DA S. DA NAZARÉ - ELVAS


MALHADO


CORETO NO PARQUE DA PIEDADE - ELVAS


CORETO NO JARDIM MUNICIPAL - ELVAS


ATRÁS DO AQUEDUCTO - ELVAS


ENTRADA DA CIDADE - ELVAS


ARCO DO BISPO - ELVAS


GRAFFITI